quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Juros mais baixos fazem CVM redobrar atenção com o risco

DCI / Theo Carnier
03/09/2009
O ciclo de taxas de juros mais baixas, que deve ser reforçado hoje depois da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), é um velho sonho da economia brasileira, mas também traz dores de cabeça: a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) colocou como uma de suas principais prioridades o acompanhamento da atuação dos gestores de risco diante dos juros menores.
A presidente da CVM, Maria Helena Santana, explica essa atenção redobrada para com os juros baixos: "Os títulos públicos, com risco zero, terão rentabilidade menor com a queda dos juros. Com esse rendimento mais baixo, os gestores terão de optar por ativos mais arriscados, o que significa que os ativos de crédito privado ganharão importância. Esse quadro nos preocupa".
Esse cenário também traz preocupação a Armínio Fraga, que foi presidente do Banco Central e atualmente preside o Conselho de Administração da BM&FBovespa. "A queda dos juros leva as pessoas a pensarem melhor em como aplicar seus recursos. O risco fica maior, e é preciso encontrar soluções para essa nova situação", afirma. De olho nesse quadro, a CVM prepara uma nova norma para a administração de carteiras de investimento, tendo em vista o risco mais alto. Essa norma vai abranger a certificação de pessoas-chave na administração dos recursos; a ênfase na estrutura e processos de gestão de riscos, para fazer credenciamento; e os mecanismos de tratamento de eventuais conflitos de interesse.
Maria Helena Santana explica que a CVM está particularmente preocupada com o assunto porque ele trata de produtos financeiros que têm ampla distribuição no chamado varejo (ou seja, abrangem um grande número de investidores): "É preciso fazer um acompanhamento muito próximo, já que se trata da mudança de perfil desse produto".
Ela recorda que em relação aos fundos de investimento é necessário fazer o acompanhamento da gestão da liquidez dos ativos em comparação às obrigações dos gestores. Como haverá maior presença de títulos privados nas carteiras, cresce a importância de desenhar produtos adequados ao investidor, que vai pressionar por ter rentabilidade em papéis de risco maior.
É essencial, na avaliação da presidente da CVM, que se tenha mais transparência com o investidor, com a explicitação das despesas do fundo e o impacto que elas têm na rentabilidade da aplicação.
Também é importante, na avaliação de Maria Helena, ter prospectos simplificados, que utilizem uma linguagem de fácil entendimento ao investidor. Na avaliação dela, essa postura "será fundamental com o risco maior das carteiras, para proteger o investidor e também todo o setor", opina.
Segundo a presidente da CVM, a transparência no tocante aos riscos mostrou-se ainda mais necessária depois da crise financeira mundial: "Houve casos de pouca transparência dos riscos. Felizmente o mercado está alerta com esse assunto e a Andima deve editar em breve um código de conduta próprio quanto à transparência", diz Santana.
Quanto aos problemas causados pela falta de transparência, Maria Helena recorda as dificuldades enfrentadas no ano passado por empresas de porte (como, por exemplo, Aracruz e Sadia), às quais teriam sido oferecidos serviços financeiros sem uma completa explicação de seu risco.
Para 2010, a CVM está preparando uma nova instrução (IN 202) sobre a divulgação da política de gestão de riscos das empresas, que inclua a opinião dos administradores sobre sua eficácia. Além disso, a comissão reforça a necessidade de aperfeiçoar o registro dos contratos nas centrais de risco (BM&FBovespa e Cetip), além da importância de uniformizar as características das bases de dados das duas centrais, para permitir a consolidação das exposições das partes.
A transparência, lembra a presidente da CVM, não se refere apenas aos fundos de investimento. A regulação deve se expandir também a outros segmentos do mercado financeiro, como fundos de private equity (capital de risco para empresas), venture capital (que apostam em empresas nascentes) e hedge funds (como são chamados os fundos que fazem aplicações mais arriscadas).
Para Armínio Fraga, é necessário que o País adote, além de mecanismos de gestão de risco para atuação em um quadro de juros mais baixos, alternativas para outras situações consideradas "delicadas", como a liquidação ordenada de instituições financeiras. "Não temos arcabouço legal para lidar com essas situações", afirma Armínio. "Por isso, seria positivo que as autoridades começassem a prestar ainda mais atenção a esse assunto."
Hoje acontece o final da reunião do Copom que define a nova taxa de juros. Especialistas esperam que a autoridade monetária mantenha a taxa em 8,75%.

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