Para ministro, ‘pancada’ da CPMF foi ‘grande’ e aumento de imposto será inevitável; União perderá ao todo R$ 160 bi, projeta
Estadão / Christiane Samarco
26/12/2007
Passado o susto com a derrota da emenda à Constituição que prorrogava até 2011 a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), o ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, não hesita em admitir que “a pancada” foi forte demais.“Não podemos simplificar a derrota”, aconselha.
De fato, a projeção da perda até o final do governo Luiz Inácio Lula da Silva soma mais de 30% do PAC, uma vez que os próprios técnicos da área econômica falaram em investimentos da ordem de R$ 500 bilhões quando foi lançado o Programa de Aceleração do Crescimento. As contas de Paulo Bernardo vão além do Orçamento de 2008. “No planejamento de longo prazo, perdemos mais de R$ 160 bilhões até o fim do governo, e não R$ 40 bilhões no ano que vem”, explica Bernardo.
Ele diz que não adianta arrancar os cabelos - “até porque não os tenho” -, mas reconhece que a equipe econômica encerra o ano de cabeça quente.Admite, também, que não vai dar para fugir do aumento de imposto. “Alguma arrecadação extra terá que vir.” E para quem aposta em briga entre Planejamento e Fazenda, Paulo Bernardo acrescenta que os dois vão virar 2008 na paz. “Conversamos várias vezes sobre isso, falei que de minha parte não tem problema e o Guido disse o mesmo. Não vamos alimentar divergências”, diz, referindo-se ao ministro da Fazenda, Guido Mantega.
O presidente Lula disse que não perdeu um minuto de sono por conta da derrota da CPMF. Os R$ 40 bilhões a menos no caixa do Tesouro tiram o seu sono?
Do ponto de vista do Planejamento, o impacto decorrente da queda da CPMF é muito mais forte. Estamos falando de uma perda de mais de R$ 160 bilhões, e não apenas do Orçamento de 2008. Toda a programação a longo prazo do governo tem que ser refeita e isso inclui o PPA (Plano Plurianual), em que o governo planeja quatro anos de investimentos. Isso quer dizer que o presidente Lula subestimou os efeitos da derrota no Senado?
É importante o presidente da República dar declarações tranqüilizadoras nesta hora, porque, de fato, não se tem que achar uma solução imediata para o problema. E é evidente que o governo tem a obrigação, até, de fazer um discurso tranqüilizador e de não tomar medidas de afogadilho. Mas, na sua avaliação, a situação é realmente grave?
Desde que me elegi deputado, em 1990, não vi situação como esta para ser resolvida pelo governo. A saúde perdeu metade dos recursos para investimentos e a área de assistência social, tocada pelo ministro Patrus Ananias (Desenvolvimento Social), um quarto. A tarefa imediata é remontar o Orçamento de 2008. Cortar os grandes programas do governo não tem condições. O presidente Lula não aceita. Mas vamos ter que ajustar o calendário. Um prejuízo deste tamanho não se resolve sem aumentar imposto. É isso?
O governo não vai fazer pacote. Isso o presidente já descartou. Mas alguma arrecadação extra terá que vir. Teremos que ter medidas pontuais para diminuir despesas e recompor a receita. Faremos cortes, remanejamentos. O presidente encarregou a mim e ao ministro Guido (Mantega, da Fazenda) de levantar tudo o que pode ser feito, sugerir medidas, e vamos nos dedicar a isso nos primeiros 15 dias de 2008. Temos que replanejar os próximos quatro anos porque o Orçamento de 2011, que será executado pelo sucessor de Lula, também é tarefa deste governo. Mas o cenário econômico interno é bastante favorável.
Temos a nosso favor o quadro muito positivo da economia. Os números do terceiro semestre mostram um crescimento de 5,7% e o do quarto semestre vai ultrapassar 6%, o que resultará em um crescimento médio anual de 5,3%. Nos últimos 11 meses geramos quase 2 milhões de vagas com carteira assinada e temos o menor desemprego dos últimos seis anos. Tem uma nova classe média consumindo, impulsionando as vendas e sustentando um ciclo virtuoso. Não podemos deixar este momento se perder. Temos que fazer a reforma tributária. Já que o senhor citou o ministro Mantega, vocês estão brigados depois das divergências?
De jeito nenhum. Conversamos várias vezes sobre isso. É muito luxo a gente achar que pode brigar neste momento, com a oposição nos acossando e com tantos problemas que temos para resolver. Não vamos trocar farpas. O ano que vem é ano de eleição municipal. O senhor acredita em reforma tributária em ano eleitoral?
Acho muito difícil votar reforma tributária em ano de eleição. Não vamos vender ilusão. Mas temos que fazer um grande esforço para isso e apresentar soluções, para que o presidente Lula passe a faixa ao sucessor e entregue um Brasil com boas perspectivas de crescimento. A despeito do cenário nacional positivo, o próprio presidente mostra-se preocupado com a crise nos Estados Unidos e na Europa. A situação de crise não resolvida do mercado imobiliário norte-americano que afetou os bancos europeus realmente preocupa e merece que a gente fique antenado.
Eles já gastaram mais de US$ 500 bilhões para contornar os problemas este ano. Se houver recessão nos Estados Unidos e problema na Europa, isso pode prejudicar o nosso crescimento. Não digo que isso vá nos afetar porque estamos com um mercado interno forte, que é um bom anteparo. Essa nova classe média que vem aumentando o consumo interno é real e isso não depende diretamente da economia externa.