Gazeta Mercantil/Caderno A / Rosana Hessel e Fernando Exman
19/03/2008
A União Européia (UE) está mudando a abordagem sobre as negociações comerciais com o Mercosul. Agora, deverá dar mais atenção ao bloco sul-americano , diante do impasse das negociações da Rodada Doha para a liberalização do comércio global no âmbito da Organização Mundial do Comércio (OMC).
Essa mudança se desenvolve esta semana, com a visita ao Brasil do presidente da Comissão Européia (CE), José Manuel Durão Barroso, que deverá defender a retomada das negociações bilaterais durante a reunião de cúpula da União Européia com a América Latina em maio, no Peru, durante o encontro de hoje, em Brasília, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
"Há uma mudança no discurso. Até agora, conclusão de Doha tem sido considerada uma pré-condição para o prosseguimento das negociações de acordos bilaterais", disse à Gazeta Mercantil o diretor do Departamento de Negociações Internacionais do Ministério das Relações Exteriores, Evandro Didonet. "Quando as últimas negociações UE-Mercosul foram interrompidas, em novembro de 2006, a UE decidiu que era necessário um desfecho em Doha, positivo ou negativo, para só depois voltar a negociar com o Mercosul. Recentemente, há sinais de que a UE está analisando o assunto", acrescentou o negociador do Itamaraty.
De acordo com o conselheiro para assuntos comerciais da Delegação da CE no Brasil, Fabian Delcros, a UE considera crítico o atual momento da Rodada Doha. Segundo ele, o representante de Comércio europeu, Peter Mandelson, "está bastante pessimista com Doha".
O setor empresarial comemora uma retomada do diálogo bilateral. "As negociações têm de caminhar de forma paralela. É um desafio ampliar os canais de diálogo e conseguir logo acessos a mercados. Não tem por que esperar", disse o deputado federal Armando Monteiro Neto (PTB-PE), presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Lembrando que a Europa responde por praticamente 50% do fluxo de Investimento Estrangeiro Direto (IED) no País e por quase 25¨% das exportações brasileiras assim como o aumento dos investimentos brasileiros no Velho Mundo, Monteiro Neto também defendeu a adoção de um mecanismo de proteção dos investimento nos dois blocos.
O deputado, Didonet e Delcros participaram, ontem, do último dia de debates do seminário "O Euro: implicações globais e relevância para a América Latina", organizado pela CE e pelo Banco Central do Brasil e realizado em São Paulo.
Durante a abertura do evento, Durão Barroso destacou em seu discurso que as negociações com a Comunidade Andina de Nações (CAN) e com a América Central estão evoluindo. "E eu estou confiante de que poderão ser concluídas em 2009", acrescentou. "No caso do Mercosul, embora as negociações relativas aos capítulos de cooperação política e econômica estejam bem avançadas, a componente comercial das negociações tem apresentado dificuldades. Acordos bilaterais não são alternativa ao processo multilateral, mas complementares", afirmou.
Próximos passos
Os primeiros passos nesse sentido já estão definidos, informou Didonet. Segundo o diplomata, haverá uma reunião de altos funcionários em Bruxelas de 2 a 4 de abril - da qual Didonet participará - para preparar o encontro ministerial UE-Mercosul que ocorrerá no dia 15 de maio, à margem da cúpula UE-América Latina em Lima.
As negociações UE-Mercosul chegam a ser até mais extensas do que a Rodada Doha, iniciada em 2001. Em 1995, a UE e o Mercosul assinaram um acordo de cooperação inter-regional, e, quatro anos depois, deram início às negociações que foram paralisadas em 2004, com uma tentativa de retomada em 2005 e com nova paralisação no final do ano seguinte.
Sobre a proposta que será levada à mesa de negociações, Didonet informou que será a mesma feita em 2005 pelo ministro das Relações Exteriores Celso Amorim. "Não conseguimos fechar as negociações em 2004, e em 2005, os ministros identificaram três áreas fundamentais para serem tratadas como prioridade para poder então relançar as negociações", disse ele citando as áreas: agricultura, flexibilidade em produtos industriais e serviços.
Na opinião do diplomata, os países membros do Mercosul estão interessados em fechar um acordo com a UE, apesar dos últimos conflitos emergidos na região. "Uma negociação com a União Européia e um eventual acordo com os países europeus seria um resultado muito importante para o Mercosul, seria uma afirmação para o bloco."
Fazendo uma analogia ao discurso de Amorim sobre Doha e como são difíceis as negociações multilaterais, Didonet disse que as ofertas do acordo UE-Mercosul "também estão sobre a mesa, os números estão identificados, o trabalho de redação de texto está esboçado". "Não é uma negociação que vai começar do zero e que necessariamente tenha que se prolongar indefinidamente", acrescentou sem dar uma data para uma conclusão.
Comparando os dois acordos, disse que são níveis diferentes de liberalização. "Em Doha você tem uma liberalização e não o livre comércio. E o principio de uma negociação bilateral é o livre comércio digamos, é um passo além de Doha em termos de profundidade do corte de tarifas", completou.
Segundo Didonet, além da UE, o Mercosul também considera uma aproximação com a Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean). O primeiro encontro ministerial deverá ocorrer durante a presidência pro tempore do Brasil, no segundo semestre.
quarta-feira, 19 de março de 2008
UE muda discurso e pretende priorizar acordo com Mercosul
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