Mesmo destacando-se entre países em desenvolvimento, presença global é restrita.Para especialistas, processo é recente no país e tende a se acentuar nos próximos anos.
G1 / Dennis Barbosa
02/01/2008
Pense em um país cujas empresas têm filiais nos países mais distantes, investem bilhões de dólares em todo o mundo e empregam dezenas de milhares de trabalhadores das mais diversas nacionalidades. Embora não seja errado pensar no Brasil desta maneira, o país ainda "engatinha" no que diz respeito a ser um grande investidor internacional, segundo especialistas ouvidos pelo G1. Somente as 20 empresas brasileiras com mais ativos no exterior possuem mais de US$ 56 bilhões alocados em países estrangeiros (dado de 2006), segundo levantamento da Fundação Dom Cabral em parceria com a Universidade de Columbia. Três companhias deste grupo, lideradas pela Odebrecht, têm mais de 10 mil empregados no exterior cada.
“Em alguns setores, como mineração e siderurgia, o Brasil atingiu o nível das grandes multinacionais. Mas, sem dúvida, a grande característica do país ainda é de receptor, e não de realizador de investimentos”, comenta Alex Agostini, economista da consultoria Austin Rating. Em 2006, pela primeira vez o fluxo de saída de investimentos diretos no Brasil (US$ 28 bilhões) foi maior que o de entrada (US$ 19 bilhões). No entanto, isso se deveu em grande parte à aquisição da canadense Inco pela Vale, por mais de US$ 18 bilhões. Chama-se investimento direto estrangeiro (IDE) o capital alocado em algum país estrangeiro para a criação de empresas agrícolas, industriais ou de serviços, com objetivos de longo prazo.Tirando-se o negócio da Inco do balanço entre investimentos recebidos e enviados, o país é definitivamente um receptor.
“Não vamos ter negócios como esse com muita freqüência”, analisa Luís Carlos Carvalho, professor da Fundação Dom Cabral que participou da realização de um ranking das maiores multinacionais brasileiras. Para efeito de comparação, no mesmo ano, os EUA investiram US$ 216 bilhões.
Ao todo, segundo a Conferência das Nações Unidas Para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad), o Brasil havia acumulado, até 2006, US$ 222 bilhões de investimentos diretos estrangeiros recebidos, contra US$ 87 bilhões enviados pelas empresas nacionais ao exterior, o que equivale a 8,2% do PIB. No Chile, essa proporção é de 18,4% e na Espanha, de 41,5%.
Na Rússia, o montante de investimentos externos feitos pelas empresas multinacionais com sede no país chega a 16%, para citar outra economia de país em desenvolvimento de grande porte que pode ser comparada à do Brasil.A distribuição por setor da economia demonstra que as maiores multinacionais brasileiras se concentram na exploração de recursos naturais, com duas empresas (Vale e Petrobras) representando mais de dois terços dos ativos no exterior das 20 maiores transnacionais.
Um segundo grupo, composto de empresas que fornecem insumos para outras indústrias, representa mais de 19% - ou seja, mais de um terço dos ativos das 20 maiores transnacionais estão relacionados a atividades da base da cadeia produtiva. Outra porção está relacionada ao setor de construção civil.
Evolução tecnológica
Mas o fato de o Brasil não ter empresas de tecnologia de ponta ou de serviços neste grupo de investidores não deveria ser empecilho à internacionalização, segundo Carvalho. “Nossas maiores empresas não são de bens intermediários, mas não tenho muita ilusão de que o Brasil precisa reproduzir todo o ciclo de evolução tecnológica dos países desenvolvidos para se internacionalizar”, comenta.Na visão do professor, as multinacionais do Brasil ainda não atingiram maior alcance porque o processo de internacionalização começou recentemente. “É um processo que começou há pouco mais de dez anos. Neste sentido, não é correto afirmar que o Brasil está ‘atrasado’”, opina.
Agostini também aponta meados dos anos 1990 como ponto inicial para a atuação internacional maciça de companhias brasileiras. “Graças à estabilidade econômica, o Brasil conseguiu entrar no jogo”, observa. Assim, nesta história recente, ainda não houve tempo para que a cultura de internacionalização se arraigasse no meio empresarial. “Falta o sentido de padrão internacional em muitas das nossas empresas”, comenta Carvalho, da Fundação Dom Cabral. “Se olharmos as empresas que se internacionalizaram, veremos que boa parte delas foi fundada por imigrantes. Esse tipo de empresa ‘retorna’ mais fácil ao exterior”, completa.
Risco-país
Para o professor, falta também mais apoio do governo e das associações empresariais: “Países como Malásia e Estados Unidos cobrem o risco-país de empresários que querem crescer no exterior (ou seja, oferecem crédito com juro equivalente ao daquele cobrado para investimento interno, assumindo o risco adicional de aplicar o recurso em país estrangeiro). Além disso, são poucas as associações ou entidades no Brasil que oferecem aos empresários uma assistência à internacionalização." Desde 2005, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) possui uma linha de financiamento voltada exclusivamente a empresas brasileiras que desejam comprar ativos no exterior.
No entanto, desde o lançamento, apenas quatro empresas assumiram financiamentos nessa modalidade, totalizando pouco mais de R$ 340 milhões. Mais da metade desse valor foi para a aquisição do maior grupo de carnes e embutidos da Argentina, Swift Armour, pelo frigorífico Friboi.Mesmo que ainda falte muito para o Brasil se tornar um grande exportador de capitais e empresas, os especialistas ouvidos pelo G1 concordam que o processo tende a se acentuar. “No mundo inteiro há fusões e aquisições, e isso não deve parar. É uma tendência mundial e, por conta da estabilidade econômica, o Brasil entrou no jogo. A única questão é saber se nossas empresas terão tempo de sair do país ou se elas serão compradas pelas multinacionais estrangeiras antes”, comenta Agostini.
Nenhum comentário:
Postar um comentário