Folha de São Paulo / André Palhano
29/10/2008
A crise financeira global acertará em cheio a onda de sustentabilidade que o mundo corporativo viu crescer nos últimos anos. Enquanto o financiamento para as organizações e projetos sociais acusa os primeiros sinais de aperto, em diversas empresas a preocupação com a área socioambiental começa a ceder espaço para a preocupação com a própria sobrevivência financeira.
Ainda que ninguém conheça ao certo a dimensão e os efeitos da crise sobre a economia real, especialistas ouvidos pela Folha são unânimes em afirmar que ela será um importante teste para a continuidade -ou a interrupção- dessa onda. m um primeiro momento, as estruturas de financiamento do chamado terceiro setor (representado pelas iniciativas da sociedade civil com caráter de utilidade pública) tendem a ser as mais afetadas devido à crise internacional.
"Estamos justamente em um momento de planejamento e, como o cenário para o próximo ano ainda é incerto, a tendência é o setor privado apertar o cinto no repasse de recursos ao terceiro setor. É um contexto preocupante para o terceiro setor como um todo e para o investimento social privado em particular", afirma Fernando Rossetti, secretário-geral do Gife (Grupo de Institutos Fundações e Empresas), entidade que reúne os principais investidores sociais privados do país.
O aperto financeiro, que em alguma medida também virá do setor público, ocorre em um ambiente em que a competição por recursos já estava acirrada, resultado do aumento no número de organizações e das exigências mais rígidas por parte dos financiadores. E coloca em xeque a própria sustentabilidade de algumas organizações.
"Sempre que acontecem cortes em orçamentos governamentais, bem como do setor privado, o terceiro setor e as áreas sociais são sempre os primeiros a sofrer", diz Cristina Pimenta, coordenadora-geral da Abia (Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids).
No Brasil, esse aperto tende a ser reforçado por uma característica local: a origem dos recursos repassados ao terceiro setor guarda estreita relação com os resultados das empresas em cada ano.
"São raros os casos aqui de fundos patrimoniais. O grosso dos recursos para o terceiro setor no país está no meio empresarial. Ou seja, dependem da performance da empresa e são geralmente votados ano a ano dentro da estratégia de investimento social de cada uma delas. Isso nos permite prever um ano pesado para o setor em 2009", afirma Marcos Kisil, presidente do Idis (Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social).
Os fundos patrimoniais (que dão nome às fundações) são geridos de forma independente da gestão financeira das empresas e, portanto, com menor dependência de seus resultados. Um provável efeito desse aperto, segundo os especialistas, é o terceiro setor no país passar por um movimento de consolidação, caracterizado por fusões de algumas organizações, maior número de parcerias estratégicas e, obviamente, pela extinção de outras.
"As organizações que conseguiram diversificar o seu modelo de sustentabilidade, diversificando as fontes de receitas, são as mais bem preparadas para passar por essa crise. As que não fizeram isso tendem a ser mais prejudicadas", afirma Rossetti, lembrando que esse movimento já ocorreu em outros países, como os EUA.
quarta-feira, 29 de outubro de 2008
Terceiro setor deve sofrer forte impacto com a crise
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