terça-feira, 28 de julho de 2009

Compensação dos créditos de ICMS esbarra na burocracia

Indústrias poderão usar imposto a receber para pagar investimentos, mas elas reclamam que não é fácil obter aprovação do governo do estado
Gazeta do Povo / Alexandre Costa Nascimento
28/07/2009
Um decreto do governo do estado, que entra em vigor em 1º de agosto, permitirá que as empresas industriais do Paraná usem créditos de ICMS para financiar novos investimentos. Mas, embora tenha sido anunciada como um “estímulo” para as indústrias no Paraná, a iniciativa pode esbarrar na burocracia do próprio estado.
Isso porque o decreto em nada altera o longo processo para a habilitação desses créditos pela Secretaria de Estado da Fazenda (Sefa). Esse procedimento costuma demorar de seis meses a um ano e é apontado pelos empresários como o maior entrave para a compensação desses créditos.
Na prática
Decreto traz risco de uso político
Além de não resolver o problema da lentidão na habilitação dos créditos de ICMS, o decreto do governo estadual cria uma brecha para a utilização política desse instrumento de compensação. Isso porque o regulamento determina que, em última instância, quem decide ou não pelo enquadramento de um projeto é o secretário de estado da Fazenda.
“A partir disso, a decisão sai da esfera técnica e passa a ser política. A medida pode então ser utilizada como instrumento para beneficiar determinados setores da economia em detrimento de outros”, avalia o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), Gilberto Luiz do Amaral. “Assim, mesmo que uma empresa atenda a todos os critérios para o enquadramento, ela pode não conseguir a compensação dos créditos, bastando para isso a falta de vontade política do secretário da Fazenda”, diz.
Do ponto de vista fiscal, avalia Amaral, o governo abre mão de uma parcela muito pequena da arrecadação já que condiciona a transferência a empresas instaladas no Paraná. “De certa forma isso força os projetos de investimento a serem compensados dentro do estado”, avalia. (ACN)
Secretaria vai pedir dados dos projetos
O Sistema de Controle da Transferência e Utilização de Créditos Acumulados (Siscred), da Secretaria de Estado da Fazenda (Sefa), contabiliza 632 empresas paranaenses cadastradas como transferentes de crédito. Mas destas, apenas 135 possuem créditos habilitados, passíveis de utilização.
A habilitação, no entanto, é apenas o primeiro passo. Para poder transformar esses recursos em investimento, a empresa interessada deverá protocolar um pedido de autorização na Sefa, com detalhes do projeto e cronograma de execução. Só poderão ser enquadrados investimentos acima de R$ 3 milhões.
“A secretaria não vai avaliar a qualidade do investimento. Cada empresário terá liberdade de investir como, quando e onde quiser. Mas é preciso ter um conhecimento mínimo sobre cada projeto”, justifica o secretário da Fa¬¬zenda, Heron Arzua.
A Sefa também limita o gasto mensal com a compensação de créditos em função do saldo devedor – somente empresas com até R$ 20 mil a pagar podem compensar 100% do imposto. Mas, segundo o secretário, no caso do emprego desses recursos em investimentos, a tabela será mais “generosa”. Existe ainda a previsão de que o valor ultrapasse o limite de créditos para projetos avaliados como de “caráter estratégico”.
O coordenador do departamento econômico da Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Maurílio Schmitt, diz que uma das vantagens da iniciativa é que ela passa a permitir a transferência desses créditos tributários a terceiros. “Quem receber os créditos dentro de um contexto de investimento, poderá negociá-lo ou ainda retransferi-lo, como uma moeda de negociação”, explica. Antes, esses créditos só podiam ser negociados no mercado – com deságio de 8% a 10% em média – e descontados por grandes empresas devedoras de ICMS junto ao governo.
Para o diretor de relações institucionais do Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário (IBPT), Fernando Steinbruch, o decreto do governo paranaense pode ser considerado um avanço em relação a outros estados da federação, mas ainda é pouco frente à necessidade das empresas. “É mais uma oportunidade, mas com uma série de limitações. Está longe de ser a solução do problema”, avalia.
O secretário da Fazenda diz que a iniciativa deverá ser aprimorada aos poucos, e que o projeto pode ser o embrião de outras soluções para compensação dos créditos tributários. “Minha ideia pessoal é aprimorar o projeto e ampliá-lo para os investimentos comerciais”, garante Arzua. (ACN)
O Paraná contabiliza cerca de R$ 600 milhões em créditos tributários que ainda não foram compensados pelo governo do estado. O valor corresponde a 25% do volume de arrecadação de ICMS gerado pelo setor industrial paranaense em 2008 e equivale ao total de investimentos do estado em transportes previstos pelo orçamento de 2009. Nem todo esse montante, porém, é sujeito ao enquadramento nas novas regras do decreto.
O próprio secretário da Fa¬¬zenda, Heron Arzua, reconhece que é impossível avaliar quanto do estoque de créditos de ICMS poderá de fato ser convertido em investimentos. “Não podemos estimar o volume desses recursos nem o quanto deste montante poderá virar investimento. Isso também depende do planejamento das empresas”, pondera.
Segundo Arzua, o objetivo da medida é fazer com que as empresas tenham mais uma alternativa na utilização desses créditos represados. Eles virariam uma moeda de troca entre fornecedores de equipamentos que pagam ICMS ao governo, por exemplo, e indústrias exportadoras que têm créditos e decidirem investir.
Essa justificativa, no entanto, parece ir em sentido contrário às recentes políticas do governo estadual envolvendo a compensação tributária. Em março deste ano, para conter os efeitos da queda na arrecadação por conta da crise econômica, o governo suspendeu por 90 dias as habilitações e transferências dos créditos de ICMS.

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