Infomoney
29/09/2008
Não é todo dia que se vê o governo dos EUA comprando US$ 700 bilhões de ativos deteriorados das principais instituições financeiras de Wall Street. Embora ainda carente de devida aprovação do Congresso, a medida é um marco no sistema financeiro não somente norte-americano, mas global. Em pleno século XXI, o intervencionismo estatal é amplamente presente sobre os mercados.
É fato que em tempos prósperos, a mão do Estado quase nunca é bem-vinda. Mas em momentos de crise como o atual, investidores e CEOs (Chief Executive Officers) enxergam o governo como uma tábua de salvação. O subprime não foge à regra. Contudo, a atuação do Fed, do Tesouro e de outras entidades da Casa Branca vêm se mostrando ativa como há muito não se via.
Se aprovado, o pacote deve promover uma antecipação do fim da crise. "É o começo do término das turbulências", chegaram a afirmar analistas na semana passada. Não à toa, os mercados reagiram com ganhos históricos. Todavia, a operação tem também seus efeitos sobre a macroeconomia norte-americana. E nem todos eles são benéficos.
Arcando com o pacote
Os dispêndios com a manobra impressionam. Para se ter uma idéia do que são US$ 700 bilhões, o PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro no quarto trimestre do ano passado somou US$ 679,583 bilhões. Isto para não falar nas injeções de liquidez e nas aquisições da Fannie Mae, Freddie Mac e AIG, entre outras medidas paliativas.
Tamanho montante não se cria de um dia para outro. De acordo com projeções do mercado, os contribuintes norte-americanos deverão arcar com até US$ 200 bilhões dos US$ 700 bilhões previstos no pacote, um peso considerável. Se as instituições de Wall Street, com todo o seu poder financeiro, já se encontram em apuros, que dirá do norte-americano de classe baixa ou média.
A situação é particularmente complexa quando colocada em seu contexto político: a iminência das eleições presidenciais. O pacote pode abalar ainda mais a já desgastada imagem de George W. Bush e, conseqüentemente, impactar a campanha do candidato republicado, John McCain.
Rombo fiscal
Há ainda os US$ 500 bilhões restantes. Ainda que o Tesouro dos EUA amplie a oferta de títulos no mercado a fim de angariar recursos para financiar o plano de socorro às instituições financeiras, cortes deverão ser conduzidos no orçamento governamental, especialmente em áreas sociais. Mais um ponto negativo para a imagem dos republicanos à véspera das eleições.
Paralelamente, as intervenções cada vez mais freqüentes do governo tendem a agravar ainda mais a situação fiscal norte-americana. No acumulado do ano fiscal de 2008, iniciado em outubro do ano passado, as contas públicas do país apresentam um rombo de US$ 483,354 bilhões até agosto. No mesmo período de 2007, o déficit foi consideravelmente menor, de US$ 274,393 bilhões.
Isto para não falar no chamado "risco moral". Quais os critérios para determinar qual ativo deve ser resgatado e qual não? Ademais, instituições financeiras até então resistentes à crise, com boas gestões e times administrativos, ficariam a ver navios, enquanto que firmas que tomaram mais riscos do que deviam receberão bilhões do governo. Algo, no mínimo, um tanto quanto injusto.
Cenário desastroso
Ainda assim, os defensores do plano orquestrado por Henry Paulson e Ben Bernanke acreditam que as conseqüências de uma passividade por parte do Federal Reserve e do governo norte-americano frente à crise seriam muito maiores e mais graves do que os custos do socorro a ser prestado, principalmente por conta da perspectiva de uma crescente falta de liquidez no mercado.
Sem conseguir efetuar suas captações regulares, companhias poderiam suspender pagamento de dívidas, contas e até mesmo de suas folhas de pagamentos. Sem salário, norte-americanos suspenderiam a prestação de impostos e tributos, deteriorando ainda mais a situação fiscal dos EUA, que paralelamente, teria que arcar com uma brusca elevação nos pedidos de ajuda financeiro, como os auxílio-desemprego.
Um cenário desastroso, marcado por uma profunda crise de confiança entre as instituições muito mais complexa de ser posteriormente revertida. Ademais, analistas acreditam que o montante de US$ 700 bilhões talvez nem venha a ser gasto inteiramente pelo governo, uma vez que mais de US$ 600 bilhões já foram reportados por instituições na forma de baixas contábeis.
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