terça-feira, 4 de novembro de 2008

Reforma Tributária, já vimos tantas vez esse filme

Gazeta Mercantil / Liliana Lavoratti
04/11/2008
Como das tantas tentativas anteriores, o debate sobre a reforma tributária que vai ter início nesta semana na comissão especial da Câmara dos Deputados, em Brasília, está fadado ao fracasso. Além de todas as razões que numa conjuntura normal já seriam mais do que suficientes para empacar o andamento de uma proposta de emenda constitucional alterando o sistema tributário vigente, agora existe uma a mais: a crise internacional provocando a desaceleração do crescimento da economia brasileira em 2009, e sabe-se lá até quando.
Toda vez que a reforma tributária ressurge no horizonte, duas coisas me vêm à cabeça. A primeira é o filminho do que aconteceu em torno desse assunto nos últimos vinte anos. E a imagem associada a essa idéia é a do cachorro correndo atrás do próprio rabo, sem encontrar uma saída. Essa situação se configura novamente com a tentativa natimorta — talvez a qüinqüagésima? — de levar uma proposta de emenda constitucional até a votação final, no plenário do Congresso Nacional.
Cabe no mínimo perguntar por que depois da Constituinte de 1988 a reforma tributária não vingou, embora a legislação vigente seja uma verdadeira colcha de retalhos em decorrência das sucessivas modificações promovidas ano após ano, de acordo com os interesses da hora — quase sempre contra o bolso do contribuinte, diga-se de passagem. Mesmo que alguns avanços tenham sido feitos, como o fim da cumulatividade do PIS e da Cofins, a grande maioria das alterações mirou o aumento da arrecadação.
Muitas coisas poderiam ser lembradas acerca disso, entretanto, uma parece mais do que clara: a reforma tributária permanece inviável. E a história é igualzinha às anteriores: os motivos para não fazer a reforma tributária superam, em número, gênero e grau, as razões favoráveis às alterações nas regras que hoje garantem ao Estado brasileiro (União, estados, municípios e Distrito Federal) abocanharem quase 40% do Produto Interno Bruto (PIB). Como dizia o então presidente da Comissão de Reforma Tributária e deputado Germano Rigotto, nas acaloradas discussões dos anos 90, a reforma tributária é a noiva que todos querem namorar, porém ninguém quer levar para o altar.
Se em tempos de vacas gordas — como antes de a crise financeira internacional respingar por aqui, ou até mesmo durante o Plano Real — as forças políticas e econômicas não conseguiram costurar um acordo para refazer o chamado pacto federativo firmado na Carta de 1988, por que em época de retração da economia haveria algum espaço para desonerar a produção e o bolso dos contribuintes em geral? Improvável, a começar pelas barreiras de toda ordem trazidas à tona quando se trata de rever a divisão das responsabilidades perante a população, estabelecidas para cada esfera de governo, e os respectivos meios para viabilizar esses serviços, na forma de cobrança de tributos. O governo federal quer concentrar cada vez mais o poder de arrecadar tributos, os governos estaduais não querem perder a galinha dos ovos de ouro (o ICMS), os sonegadores não querem pagar mais, e assim por diante.
Refazer o famigerado pacto federativo é uma tarefa gigante que requer, acima de tudo, força política. Se os dois partidos que ocuparam o Palácio do Planalto desde que o País começou a pensar em reforma tributária — dois mandatos do PSDB e o PT, em seu segundo — não fizeram isso quando eleitos ou reeleitos, por que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva encararia uma encrenca desse tamanho a partir de agora, reta final de seu governo? Justamente agora que a própria equipe econômica admite reduzir o tamanho do superávit primário — que, a exemplo da reforma tributária, foi vendido aos brasileiros como o caminho que nos levaria ao paraíso.
Por isso, o debate que os parlamentares planejam começar nesta semana não trará nada de novo. Vamos rever um filme bem batido.

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